Capacitação de educadores: Transformando o Ensino através do Programa de Desenvolvimento Profissional EMBRACE

A transformação digital global foi acelerada pela pandemia da COVID-19, mas também revelou o papel decisivo que a inovação disruptiva pode desempenhar, levando a um senso de urgência sobre a educação digital e preocupações com sua qualidade. No mundo pós-Covid, a educação digital está no topo das agendas políticas tanto da União Europeia quanto da América Latina e do Caribe. O rápido avanço de novas tecnologias, como inteligência artificial, robótica, computação em nuvem e blockchain, torna cada vez mais importante o investimento no desenvolvimento de habilidades digitais. (por exemplo, Sabzalieva et al., 2024; Staring et al., 2022; Comissão Europeia, 2020)

Em ambos os continentes, Europa e América Latina e Caribe, há um entendimento comum do componente crítico na educação digital, que é, obviamente, as competências dos professores, seguido pela liderança e pela “digivisão” da instituição, conteúdo digital adequado e infraestrutura (Sabzalieva et al., 2024; Comissão Europeia, 2020). Ainda há uma lacuna significativa nas competências digitais entre os professores e o desenvolvimento e treinamento profissional contínuo são essenciais para apoiar a transformação digital no ensino superior. Tanto no Brasil quanto na Colômbia, há políticas ou estratégias nacionais que enfatizam esses aspectos de desenvolvimento digital na educação, por exemplo: Política Nacional de Educação Digital (2023, recentemente transformada em lei no Brasil) que promove o aprimoramento das habilidades digitais dos professores para criar inovação pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem, com o reforço de habilidades analíticas e críticas, ética aplicada ao ambiente digital, alfabetização midiática e cidadania na era digital (Governo do Brasil, Presidência da República, 2024; Ivenicki, 2024), e Estrategia Nacional Digital de Colombia 2023 – 2026, que visa posicionar a Colômbia como líder em inovação digital e inclusão, impulsionando o desenvolvimento sustentável e a equidade social por meio de uma transformação digital abrangente (Governo da Colômbia, 2023).

A educação pode se beneficiar da abertura de salas de aula tradicionais para espaços digitais e os alunos podem ser capacitados por novas possibilidades, ferramentas e ambientes digitais. Durante a pandemia da COVID-19, a pesquisa mostra que a transformação digital pode aumentar o acesso ao ensino superior, especialmente em áreas remotas, e que as universidades podem desempenhar um papel crucial no apoio à alfabetização digital em suas comunidades. O acesso e o uso de tecnologias digitais podem ajudar a reduzir a lacuna de aprendizado entre alunos de nível socioeconômico alto e baixo, e a digitalização apoia caminhos educacionais mais flexíveis e a internacionalização, reconhecendo as competências adquiridas fora dos formatos tradicionais e promovendo microcredenciais. (por exemplo, Sabzalieva et al., 2024; Ivenicki, 2024; Comissão Europeia, 2020)

Entretanto, a pandemia da COVID-19 também expôs o surgimento da exclusão digital e ressaltou a necessidade de garantir o acesso, a equidade e a inclusão. A situação variou entre países e contextos, por exemplo, de acordo com Ivenicki (2024), em países multiculturais e desiguais como o Brasil, houve efeitos mistos relacionados a preocupações multiculturais e sensíveis à equidade relacionadas ao acesso a artefatos digitais, bem como à articulação de aprendizagem digital e práticas curriculares. Além disso, a pesquisa mostra que há uma necessidade crescente de alfabetização midiática e uma ampla combinação de habilidades relacionadas à ética, segurança e proteção digital, bem como à privacidade e à proteção de dados. (por exemplo, Sabzalieva et al., 2024; Ivenicki, 2024; Comissão Europeia, 2020)

Considerando isso, é fundamental discutir o que significa aprendizagem digital significativa e de qualidade no contexto do ensino superior e até que ponto os professores estão equipados com tecnologias digitais e estratégias curriculares e pedagógicas destinadas a promover esse tipo de aprendizagem. Também devemos encontrar maneiras de aproveitar a transformação digital para melhorar a equidade e a justiça social nos contextos locais em que a aprendizagem digital é desenvolvida. O projeto EMBRACE está lidando com essas questões, começando com o desenvolvimento profissional das competências digitais e pedagógicas dos professores e passando para o estabelecimento de comunidades de aprendizagem profissional e mecanismos de apoio institucional, bem como para a liderança transformadora dos diretores e gerentes das instituições parceiras.

Programa de Desenvolvimento Profissional da EMBRACE

Um dos três principais objetivos do projeto EMBRACE é aprimorar a competência digital e pedagógica dos professores de ensino superior para planejar, implementar e avaliar com eficácia a educação (on-line) centrada no aluno e baseada em competências. Assim, o projeto teve início com o processo em cascata de desenvolvimento de competências dos professores, facilitado pelo coordenador da Häme University of Applied Sciences (HAMK) em colaboração com os parceiros. O processo incluiu três etapas: 1) Programa de desenvolvimento profissional para os 25 professores selecionados, cinco de cada instituição parceira no Brasil e na Colômbia; 2) processo de treinamento para 50 a 75 professores tutores das instituições brasileiras e colombianas; e 3) Curso on-line aberto e massivo para a comunidade educacional em geral (veja a Figura 1 abaixo).

Na primeira fase, o objetivo do programa de Desenvolvimento Profissional era aprofundar as competências dos professores para que se tornassem agentes de mudança e Desenvolvedores Institucionais, com uma perspectiva mais ampla sobre o desenvolvimento educacional e pedagógico. Esses professores tiveram sessões semanais de treinamento on-line de 2 horas entre setembro e dezembro de 2023, totalizando 14 sessões sobre vários tópicos, como: princípios da educação centrada no aluno, diálogo e bem-estar na aprendizagem, pedagogia inovadora, ferramentas digitais e gamificação, design de aprendizagem, inclusão e acessibilidade, educação baseada em competências, colaboração com o mundo do trabalho, pedagogia de inovação multidisciplinar e professor como desenvolvedor por meio de pesquisa baseada na prática. O programa também incluiu tarefas práticas de colaboração em vários tópicos. Além disso, os professores participantes receberam quatro sessões de orientação on-line temáticas e semiestruturadas, com duração de uma hora por sessão e por instituição, para apoiar a agência de mudança dos professores.

Juntamente com o treinamento, os Desenvolvedores Institucionais projetaram e construíram três Cursos Online Abertos e Massivos (MOOCs) relacionados ao MOOC1 Pedagogia Digital, MOOC2 Pedagogia Ativa e MOOC3 Colaboração com o Mundo do Trabalho. Os parceiros decidiram usar a Estrutura Europeia para a Competência Digital de Educadores (DigCompEdu) para a concepção das competências e dos conteúdos dos MOOCs (veja a Figura 2 abaixo).

DigCompEdu é uma estrutura baseada em pesquisa que descreve as competências de um professor digitalmente competente. A estrutura é aplicável a educadores em todos os níveis de educação, desde a primeira infância até a educação superior e de adultos, incluindo educação e treinamento geral e vocacional, educação para necessidades especiais e contextos de aprendizagem não formal (Punie & Redecker, 2017). A Figura 2 descreve como as competências do DigCompEdu são abordadas nos três MOOCs.

Além disso, os Desenvolvedores Institucionais projetaram um processo de treinamento para os Professores Tutores em suas instituições, que é implementado na segunda fase do modelo em cascata, incluindo a pilotagem dos MOOCs e sessões adicionais on-line ou presenciais para refletir os tópicos dos MOOCs, aprofundar a compreensão dos Professores Tutores e discutir sua futura função como mentores pedagógicos para seus colegas. O feedback dos professores tutores é usado para o desenvolvimento posterior dos três MOOCs.

A terceira fase inclui o lançamento dos três MOOCs para a comunidade educacional mais ampla na América Latina e internacionalmente. Espera-se que o lançamento ocorra no início do ano de 2025.

Primeiras reflexões iniciais dos professores participantes

O processo do programa de treinamento ainda está em andamento, mas o primeiro feedback recebido dos professores participantes foi bastante positivo. Os MOOCs foram considerados de alta qualidade e ricos em conteúdo; talvez fosse possível incluir mais interação. Algumas áreas de desenvolvimento foram destacadas, como a acessibilidade das ferramentas e dos recursos escolhidos, bem como dos MOOCs, modelos e materiais produzidos no projeto, um aspecto que também foi destacado na pesquisa sobre digitalização durante e após a pandemia.

“Refletindo sobre os treinamentos on-line oferecidos no projeto EMBRACE, destaco que o conteúdo foi extremamente enriquecedor, principalmente pela abordagem centrada no aluno, que introduziu novas formas de avaliação e reflexões valiosas sobre o processo de ensino-aprendizagem. Entretanto, como deficiente visual, enfrentei alguns desafios de acessibilidade em determinados aspectos do treinamento…”
“O trabalho em grupo foi um momento valioso para consolidar o aprendizado, permitindo a participação ativa e o registro do conteúdo discutido… não houve tempo suficiente para que todos contribuíssem plenamente”
“Como desenvolvedora institucional, vejo que o primeiro passo para promover mudanças pedagógicas inclusivas na UFABC seria implementar os conhecimentos adquiridos durante o treinamento… Destaco a importância de formar parcerias entre os professores, trabalhando em duplas durante as atividades didáticas, tanto presenciais quanto remotas, para explorar e facilitar o uso das ferramentas digitais.”

Júlio F. B. Facó (Institutional Developer, UFABC)

References:

• European Commission (2020). Digital Education Action Plan 2021-2027: Resetting education and training for the digital age, available at: https://ec.europa.eu/education/sites/education/files/document-library-docs/deap-communication-sept2020_en.pdf
• Ivenicki, A. (2024). Digital Learning and Higher Education in Brazil: A Multicultural Analysis. Journal of Comparative & International Higher Education, 16 (2), pp. 127-135.
• DOI: 10.32674/jcihe.v16i2.5846
• OECD (2023). Country Digital Education Ecosystems and Governance: A Companion to Digital Education Outlook 2023. OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/906134d4-en. Available at: https://www.oecd-ilibrary.org/deliver/906134d4-en.pdf?itemId=%2Fcontent%2Fpublication%2F906134d4-en&mimeType=pdf
• Government of Brazil, Presidency of the Republic (2024). Lei L14533 institui a Política Nacional de Educação Digital (PNED), available at: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/L14533.htm
• Government of Colombia (2023). Estrategia Nacional Digital de Colombia 2023 – 2026, available at: https://www.mintic.gov.co/portal/715/articles-334120_recurso_1.pdf
• Punie, Y., editor(s), Redecker, C. (2017). European Framework for the Digital Competence of Educators: DigCompEdu, Publications Office of the European Union, Luxembourg, doi:10.2760/178382 (print),10.2760/159770 (online). Available at: https://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/handle/JRC107466
• Sabzalieva, E., Chacón, E., Estrela Pereira, A., Valentini, A., Gamarra Caballero, L. & Abdrasheva, D. (2024). Transforming the digital landscape of higher education in Latin America and the Caribbean. The United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization, Paris, France. Available at: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000388361
• Staring, F., Brown, M., Bacsich, P. & Ifenthaler, D. (2022). Digital Higher Education: Emerging Quality Standards, Practices and Supports, OECD Education Working Paper No. 281. https://dx.doi.org/10.1787/f622f257-en